terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Dias Loureiro a nu e Cavaco despido. Para quem não lê o expresso

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Carta a um homem inteligente, meticuloso e cuidadoso

Manuel Dias Loureiro é, indiscutivelmente, um homem inteligente, trabalhador e competente. Por isso se tornou um dos mais importantes militantes do PSD, chegando a secretário-geral dos sociais-democratas. Por isso se tornou um pilar do chamado cavaquismo, exercendo bem os cargos político-ministeriais que ocupou. Por isso, após ter abandonado a política, se tornou num homem de negócios de sucesso. Rico, no dizer de alguns. Com uma vida confortável, segundo o próprio.
Ninguém consegue uma carreira assim sem ser meticuloso e cuidadoso: no primeiro caso tomando nota de todos os factos que possam vir a ser relevantes para esclarecer o passado ou iluminar o futuro; no segundo escolhendo as companhias que permitam chegar ao topo da montanha.
No caso do Banco Português de Negócios, Dias Loureiro diz certamente a verdade - a sua verdade. Mas há factos que, pelo menos, a contraditam. Vejamos.
Em Março de 2001, a revista 'Exame', dirigida pelo jornalista Camilo Lourenço, publica em manchete a notícia de que o Banco de Portugal tinha passado um cartão amarelo ao BPN. Dias Loureiro diz ter ficado muito incomodado e pedido explicações ao presidente da instituição, Oliveira Costa. Este terá respondido que eram notícias infundadas, originadas por invejas. Mas, se ficou incomodado, Dias Loureiro não o disse a Camilo Lourenço. Pelo contrário, segundo a versão do jornalista,, telefonou-lhe a dar conta do seu desagrado pelo forma como o BPN tinha sido tratado; a dizer-lhe que o assunto tinha criado um problema de imagem ao banco; que Oliveira Costa estava muito "incomodado" e pensava processar a revista (o que fez, tendo esta de pagar milhares de euros num acordo extrajudicial). Primeira contradição.
Na sequência do artigo, Dias Loureiro insiste que ficou tão preocupado que decidiu ir ao Banco de Portugal em 29 de Abril de 2001 (notável precisão!), num encontro intermediado por Miguel Beleza, para falar com o vice-governador António Marta, responsável pela supervisão. Objectivo: pedir-lhe que, embora sem ter conhecimento de nada, "tivesse uma atenção especial ao BPN", já que o modelo de gestão do banco não lhe inspirava confiança e havia accionistas que sentia que faziam negócios com a instituição.
Como é conhecido, António Marta desmente de forma peremptória ("ou está a fazer confusão com a pessoa ou a mentir"), sustentando que o que Dias Loureiro lhe foi perguntar é porque o Banco de Portugal andava tão atento ao BPN, além de afirmar que as pessoas à frente do banco eram tudo "boa gente". Segunda contradição.
Mas para quem estava tão preocupado com a falta de transparência da gestão do banco (queixa-se que Oliveira Costa fazia poucas reuniões, não falava com ele e não havia actas), Dias Loureiro fez pouco. Como jurista, sabe que as sociedades são obrigadas a reunir o conselho de administração e a fazer actas das suas reuniões. Desses factos concretos, que se saiba, não apresentou queixa ao Banco de Portugal. Terceira contradição.
Mais extraordinário é que nesse mesmo ano da graça de 2001 o próprio Dias Loureiro tenha apresentado a Oliveira Costa o empresário porto-riquenho Hector Hoyos; que tenha sido o próprio Dias Loureiro a sugerir a Oliveira Costa a aquisição de duas empresas tecnológicas de Porto Rico, pertença daquele empresário; que as negociações tenham decorrido na casa de Dias Loureiro, no Estoril; que após o acordo sobre o negócio, envolvendo 71,25 milhões, Dias Loureiro e Oliveira Costa se tenham deslocado a Porto Rico para o concretizar; que os dois tenham constatado que nenhuma das empresa tinha activos tangíveis, a não ser um escritório em San Juan de Porto Rico, que fechou poucos meses depois; e que o dinheiro em causa se evaporou, perdendo-se em contas "offshore".
Sabendo de tudo isto, a cereja em cima do bolo é que Dias Loureiro tomou como boas as explicações de Oliveira Costa para o facto da operação não constar nas contas do banco de 2001 - e assinou-as. Quarta contradição.
Ora um homem inteligente, meticuloso e cuidadoso não se dá com pessoas como o senhor Hoyos; muito menos propõe negócios com tais pessoas; e ainda menos através de zonas "offshore". Dias Loureiro tem, pois, de se esforçar um pouco mais nas suas explicações para nos provar que merece continuar a ocupar o alto cargo de conselheiro do Estado da República Portuguesa. Ou que passou a ter uma vida confortável, nas suas palavras, exclusivamente como resultado do seu enorme talento e do seu inusitado esforço. Porque, como escreveu Pacheco Pereira na 'Sábado', "ficar milionário do nada, tornar-se um grande capitão de negócios "ex nihilo", um superadvogado de grandes negócios, um dono de empresas valendo milhões, isso é impossível acontecer com um salário de deputado ou de ministro".
P.S. - O Presidente da República resolveu divulgar um comunicado, esclarecendo que não tem qualquer envolvimento no caso BPN. Não exerceu funções, não recebeu remunerações, nunca comprou ou vendeu nada ao BPN e às suas empresas, nem contraiu nenhum empréstimo junto desta instituição. Cavaco Silva é um homem íntegro, de uma honestidade acima de qualquer suspeita. Por isso mais se estranha que, no comunicado que publicou, não tenha esclarecido que foi accionista da Sociedade Lusa de Negócios por um curto período até 2003, assim como a sua filha. Para quem queria acabar com todas as dúvidas, faltou lamentavelmente esta referência.


Nicolau Santos
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